DS 2012: Entre o Artificial e o Real


Dia 6: Sexta, 20 de julho de 2012.

Da cobertura onde mora no alto da Boa Viagem, o Dr. Alexandre Falcão* tem uma visão privilegiada do Museu de Arte Contemporânea de Niterói, das praias da zona sul, da baía de Guanabara e, claro, do Cristo Redentor reluzindo como se o próprio Cristo fosse. Dr. Falcão acha que aquele brilho todo é um pouco seu também. Afinal, se ele não fosse quem é, o Cristo não brilharia tanto, a baía não seria tão exuberante, as praias menos atraentes e o museu da cidade um antiquário qualquer. Dr. Falcão incorpora à sua pessoa tudo o que tem – e tudo o que vê seletivamente. Ele acredita que dinheiro compra tudo. Dono de uma grande empresa e proprietário de diversos imóveis em Niterói, Rio de Janeiro e Região dos Lagos, nada falta ao Dr. Falcão. A não ser saúde e o perfeito discernimento das coisas, pois ele ainda acredita que tem tudo isso.

Aos 62 anos de idade, seu Alexandre é conhecido por todos aqui – os que ainda estão lúcidos conhecem bem sua história. Ele teve tudo isso mesmo, foi um dos homens mais importantes de Niterói. Mas os jogos de poder, as mulheres e outros vícios que tinha destruíram seu patrimônio, sua família e, por fim, sua saúde. Hoje seu Alexandre é um dos idosos atendidos neste asilo e não tem mais nada. Saber disso tudo e ver o estado em que se encontra, muito magro e numa cadeira de rodas, é triste demais. Parece ser um dos mais velhos – eu daria uns 90 anos pra ele. E contei esta triste história pra mostrar quão limitados todos somos, quão incapazes de deter a vida (muito menos qualquer bem ou pessoa) em nossas mãos. Se nossa missão aqui nesta vida for acumular riquezas simplesmente, quão pobres somos! Se acreditarmos que esta vida é tudo que podemos esperar, quão medíocre seremos! Como já dizia o autor de Eclesiastes, "tenho visto tudo o que é feito debaixo do sol; tudo é inútil, é correr atrás do vento!" (Ec 1.14). Podemos fazer muitas coisas legítimas na vida e ainda assim nenhuma importante.

Hoje, a tarde no asilo foi extremamente agradável! Quando cheguei tinha um senhor voluntário tocando teclado e cantando músicas pras minhas avós - de tanto ser chamado de "meu neto" eu acreditei. Esse mesmo senhor também ensina os idosos a fazerem trabalhos manuais reciclando garrafas pet e latinhas, que viram samambaias e flores artificiais que decoram toda a casa - muito bem feitas mesmo. Eu o cumprimentei pela iniciativa. Conversei com todos os idosos. As que já tinha conhecido ontem, se maravilhavam quando eu as chamava pelo nome: "Você lembra! Que amor!". Hahaha. Por isso gostava de as chamar pelo nome toda hora. Elas têm um nome, ora bolas! E hoje eu conheci outros idosos, muitos homens, que eu não havia conhecido ontem. Conversei com cada um e me alegrei com a alegria deles ao verem a atenção que eu lhes dispensava. Não falo assim querendo me promover, gabar ou coisa assim - também juro que não tenho aspirações políticas! Haha. Mas para mostrar que o que eles mais precisam está ao alcance de todos nós! Eu mesmo tenho descoberto isso estes dias! Hoje eu li os Salmos 23 e 121 para um grupo de idosas que me pediram isso. Tem umas duas que me chamam de pastor, aliás. Enquanto eu lia, elas ficavam de olhos fechados dizendo "amém" e "glória a Deus". Repeti a leitura de cada salmo. Destas 5 ou 6 idosas, só uma era crente declarada, mas percebi que as outras também queriam Deus - que não vê rótulos, mas o coração. A Palavra de Deus é tremenda e dá conforto aos homens. Ela esquadrinha os corações e revela os mistérios escondidos do Pai. Os simples podem ouvi-la e entendê-la, mas os de coração duro escolhem um caminho de morte. Minhas últimas frases lembram muito os salmos e provérbios bíblicos. São simples, profundos e verdadeiros. Para todos entenderem - como já diziam meu professor Luís Pires e minha querida pastora Ana Cristina Vilaça.

Ao sair do asilo, liguei para um casal de amigos que morava próximo a fim de visitar sua filha recém-nascida. Que neném linda! Que bênção é um filho, um ser humano quando vem ao mundo! Quanta alegria traz a um lar! Pareço estar esta semana toda em contato com extremos: infância e velhice, vida e morte. Acontece muita coisa no meio do caminho. Como você tem vivido sua vida? Como você tem tratado as pessoas que conhece? Que significado há em tudo isso? Ou você só vive pra você? Você pode estar louco e ainda não ter se dado conta disso.

*Nome e local da residência fictícios a fim de não expor o idoso e sua família.

Confira, daqui a pouco, o sétimo e último dia do Desafio do Seminarista!

Comentários

  1. Usufruir em abundância desse "meio tempo" é uma dádiva! Seguir um Deus que nos dá liberdade e ao mesmo tempo discernimento e inteligência pra fazermos escolhas sensatas é maravilhoso!

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  2. Não é, Leandro?! hehehe

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